sexta-feira, 3 de setembro de 2010

COLUNA 'NA CONTRAMÃO' - Por Nancy Nuyen

Sofrimento mental no trabalho.



(por Nancy Nuyen)





Passei os últimos dias refletindo sobre isso e imediatamente pensei no pesquisador francês Christophe Dejours, psiquiatra, psicanalista e professor. Para ele, o sofrimento no ambiente de trabalho varia em função da política administrativa de cada empresa. E este sofrimento começa quando há o “choque entre uma história individual (do trabalhador), portadora de projetos, de esperanças e desejos, e uma organização do trabalho que os ignora”.


O corpo é a primeira vitima do sistema rígido de produção e, em segundo lugar, o aparelho psíquico. Dejours dedicou-se a investigar as estratégias que os trabalhadores usam para enfrentar a situação de trabalho.


Para ele, um golpe brutal nestes trabalhadores é a frustração de suas expectativas iniciais. Senão, vejamos: a publicidade do mercado de trabalho promete felicidade, satisfação pessoal e material. Porém, quando está lá, trabalhando, o sentimento é de infelicidade. O autor traz uma abordagem profunda sobre esse conceito (sofrimento do trabalho), com destaque para a dicotomia “bem-estar” e “loucura”, no chamado “teatro do trabalho”.


Tudo isso ocupou minha cabeça, tendo em vista uma situação bastante singular e concreta, mas que representa, com certeza, um entre tantos casos do universo em questão: o mundo do trabalho na contemporaneidade.


Uma colega, já aposentada, doente, que cuida da mãe também doente, não tem apoio nenhum da instituição para a qual dedicou praticamente toda a sua vida, quando precisa realizar uma cirurgia delicada, num hospital público.


Esse apoio ao qual me refiro não é financeiro. Ela só precisa de uma companhia, no hospital, para não se sentir só, para se sentir mais segura, momentos antes de enfrentar a cirurgia.

Tudo isso aconteceu nos últimos dias. Amanhã (escrevo esta coluna na quinta-feira) estarei lá, com ela. Não sou sua contemporânea na instituição e nem sua amiga íntima, mas, por alguma razão, tive a honra de ser escolhida por ela para partilhar um momento de angústia, espera e ansiedade.


Não canso de repetir: desconfio que as pessoas se adivinham.


Nestes momentos, longe dos holofotes de congressos, publicações e seminários que enaltecem o quadro institucional, é difícil encontrar gente, gente de verdade. Eu falo de solidariedade. O mundo do trabalho seria bem melhor com ela.


Fica a dica para quem quiser saber mais sobre o assunto, ou seja, algumas obras belíssimas de Dejours: Uma nova visão do sofrimento humano nas organizações. O indivíduo na organização: dimensões esquecidas, São Paulo, Atlas, 1993; Psicodinâmica do trabalho: contribuições da escola dejouriana à análise da relação prazer, sofrimento trabalho, São Paulo, Atlas, 1994; A banalização da injustiça social. Rio de Janeiro, FGV, 2000; A Loucura do trabalho: estudo de Psicopatologia do Trabalho. São Paulo, Cortez, 1998; e O fator humano, Rio de Janeiro, Editora da FGV; 1997.




* Nancy Nuyen é jornalista, professora universitária, anarquista, roqueira e colaboradora ás sextas-feiras do I.N.T.E.R.V.3.N.Ç.Ã.O  H.U.M.4.N.A.*



Um comentário:

  1. Ótima questão, bem atual...
    A humanização no e do ambiente de trabalho, e de todos os ambientes, deve ser uma iniciativa de cada um...Não temos que esperar os outros terem a atitude para termos em que nos espelhar.
    Um bom exemplo contagia o ambiente!

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Á vontade, como se estivesse em casa...